28 maio 2016

Gregório Duvivier, um autor-ator

Autor-ator, ator-autor. Não se sabe. Gregório Duvivier é uma mistura inteligente de fazer graça com as palavras. Escreve com tanta personalidade como quando atua. Seus passos em paco são palavras embaralhadas, improvisadas. As linhas do texto são cenas protagonizadas em ensaio.
Gregório Duvivier é um ator, mas também humorista, roteirista e escritor. Ficou conhecido pelo seu trabalho no cinema e no teatro e, desde 2012, tornou-se o Gregório do Porta dos Fundos, canal de humor no youtube. É autor dos livros A partir de amanhã eu juro que a vida é agora, Ligue os pontos – Poemas de amor e Big Bang, Put Some Farofa e Percatempos – tudo que faço quando não sei o que fazer. Gregório Duvivier também assina uma coluna semanal na Folha de S. Paulo.
No dia 22 de novembro, o escritor participou do evento Campus Festival, falando sobre a sua vida profissional, bem como declarando opiniões a respeito de determinados temas que costuma tratar em suas colunas, como a religião e a legalização da maconha. Vem conferir e conhecer mais um pouco desse cara!

Dani Fechine: Como foi a sua carreira até atingir esse momento que você vive hoje?
Gregório Duvivier: Sou ator, antes de mais nada. Comecei a fazer tetro com nove anos de idade, então sou apaixonado por teatro, é isso que me define. Mas aos poucos fui descobrindo o prazer de escrever, inclusive, para teatro. Porque eu acho que o autor consegue dizer o que pensa e o ator não. O ator só diz o que pensa através dos trabalhos que ele escolhe. Então eu senti a vontade de dizer o que eu pensava e comecei a escrever para teatro, fazer vídeos. O Porta dos Fundos veio exatamente para isso. A gente queria ser autor-ator, gênero que eu acho muito legal. De modo geral tenho escrito e atuado por aí.

DF: Quando foi que nasceu o Gregório ator, humorista, e o Gregório escritor?
GD: O Gregório humorista nasceu no tablado, no teatro mesmo. Quando comecei a fazer teatro eu vi o poder do riso e isso é viciante. Supre uma carência de todos nós, eu acho, de aprovação, de afeto. Em geral o humorista não se declara humorista, as pessoas é que o declaram. Só quando subi no palco foi que eu percebi que as pessoas estavam rindo de mim.

DF: Qual foi o momento mais decisivo da sua carreira?
GD: Foi quando eu saí da Globo para fazer o Porta. Nós [a equipe do Porta] éramos contratados da Globo e escolhemos sair daquela emissora, que era um emprego seguro, para fazer o nosso próprio negócio. Foi um momento bem decisivo.

DF: Quem são seus grandes inspiradores?
GD: No humor, tem o Millôr Fernandes, com um humor das antigas, escrito e desenhado. Como ator, o Pedro Cardoso, que é um cara que eu amo, Fernanda Torres também acho genial, brilhante. A gente tem no Brasil essa tradição de bons atores-autores, como o Pedro e a Fernanda. Atores que escrevem muito bem ou autores que atuam muito bem. Lá fora, claro, destaco Woody Allen. Gosto muito das pessoas que fazem humor com drama. Chaplin, por exemplo, acima de tudo. Pessoas que fazem humor com poesia, sobretudo, acho que isso é muito fundamental.

DF: Você se imaginava chegar até onde você chegou?
GD: Sim, mas eu imaginava na verdade coisas muito maiores. Quando eu era pequeno eu imaginava que eu ia ganhar o Prêmio Nobel da Paz. Eu tinha ambições muito maiores que essa. Achei que com 29 anos já teria morado em oito países diferentes e nem saí do Brasil praticamente, nem nunca morei fora. Achei que eu fosse ter resolvido vários problemas internacionais, e eu não fiz nada.

DF: Você acha que é possível quebrar o lado conservador da mídia?
GD: Sim, eu acho que é função de todos nós escrevermos, empurrarmos as fronteiras. Porque as pessoas falam sempre que não pode. O jornal está dizendo o tempo todo a maneira como você tem que escrever. Na faculdade de jornalismo você aprende o tempo a pirâmide invertida. Eu acho que é tarefa nossa dizer: “quem falou que é assim?” O jornalismo sabe mesmo fazer? Os donos dos jornais estão falindo, então você querem dizer pra gente como é que faz? Então, de modo geral, tem-se muito a aprender com quem está escrevendo hoje, os jovens principalmente, e os jornais têm que aprender com eles. O modelo antigo do jornalismo, inclusive vinculado a grandes empresas e interesses privados, está caindo, está decadente. Os grandes jornais estão sempre ligados a grandes famílias de poder no Brasil. Isso eu acho criminoso, é sinal que nós somos um país muito atrasado em relação à liberdade de imprensa. E acho que a internet está mudando isso. Nós temos uma imprensa mais livre, eu acredito muito no poder da internet quando se trata disso.

DF: Os seus textos da Folha, geralmente, causam muitos debates na mídia. Como você lida com o confronto de opiniões?
GD: Eu acho que a competição é muito necessária. É muito importante as pessoas discordarem de você. Particularmente, eu não gosto muito de me envolver em brigas na internet, porque eu acho que elas são pouco frutíferas. Acho bom os diálogos interessantes. Me incomoda os diálogos ofensivos, que te desautoriza e parte para taques pessoais. Esses eu nem leio, porque sei que vou me magoar.

DF: Quais dificuldades você encontra para defender as suas bandeiras sociais e políticas?
GD: Eu acho que a gente vive num país que está com a democracia ainda muito verde, começando. As pessoas não estão acostumadas a discordar. Me incomoda que o Brasil ainda seja um país muito conservador. Um país onde nunca houve uma grande revolução, apenas golpes. E os golpes no Brasil não vieram para mudar a estrutura social, vieram para dar continuidade. Então, de modo geral, o Brasil é um país que não sabe mudar e não quer mudar. Penso que nós somos muito retrógrados e antigos. O aborto no Brasil, por exemplo, nem está sendo discutido direito. As drogas, ninguém fala de drogas sem preconceito. Os Estados Unidos são também um país conservador, mas eles já perceberam que algumas batalhas já se perderam e que é melhor regulamentar do que fazer a guerra às drogas. Além disso, ninguém vai conseguir acabar com o aborto, ele vai continuar sendo feito, mas de forma perigosa para a mulher. Então tem que liberar exatamente para que ele seja mais seguro.

DF: Como você acha que a internet, o humor, a arte, podem ajudar no debate político da sociedade?
GD: Eu acho que a internet possibilita você a ter diálogos mais horizontais. Eu acho que assim as coisas se resolvem melhor. Vertical é o que o jornal faz, é uma pessoa que diz o que você vai ler todos os dias. É uma relação de poder. E na internet é uma relação horizontal, você escolhe o que você vai ler. Você está falando de igual para igual com o leitor. Jornalista e leitor são semelhantes e isso é muito poderoso. Você passa a ter outro tipo de relação entre conteúdo e leitor, entre produtor e conteúdo, entre consumidor e conteúdo. Você vai ter relações mais livres. E eu acredito muito nisso: internet livre, conhecimento livre. Acho que isso é muito utópico, mas é muito bonito acreditar nisso.

DF: De quem surgiu a ideia de colocar no Porta dos Fundos os debates religiosos, sociais, políticos?
GD: A gente sempre gostou disso. Porque eu acho que o tabu é uma grande inspiração para a comédia. O humor bebe muito no risco, no proibido. Por isso é tão comum crise de riso em velório, enterro e, de modo geral, aquilo que você não pode rir é a coisa mais engraçada que tem. Então a gente se alimenta muito de tabu, com certeza. E acreditamos muito que a piada é muito poderosa. Acreditamos no poder do humor.

DF: E quais são os planos daqui pra frente?
GD: Continuidade, acima de tudo. O problema da internet é que as pessoas fazem tudo achando que é um hobby e não leva a sério, não continua. E a gente quer, sobretudo, continuar fazendo o que a gente faz. E eu quero continuar escrevendo, continuar atuando. Esse ano teve a peça do Porta, ano que vem o filme. Tem sempre outros braços que a gente vai esticando.


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