15 dezembro 2017

#DiárioDeLeitura: O casamento

Nas minhas andanças por congressos na área de jornalismo, conheci uma pessoa que me fez apaixonar, cada vez mais, pela profissão. Com reportagens literárias, em profundidade e subjetivas, fiz de Fabiana Moraes não apenas uma grande inspiração, mas também objeto do meu trabalho de conclusão de curso. Pelo Jornal do Commercio, em Pernambuco, se destacou como repórter especial, produzindo séries e grandes reportagens que marcaram a sua carreira de jornalista e a vida de pessoas que se dispuseram a ler essas empreitadas.

Um desses especiais ganhou o título de A Vida é Nelson, em agosto de 2012. Essa frase ecoa sempre, para onde quer que eu vá. Fabiana precisava encontrar histórias reais que, de tão absurdas, pareciam ficção. Foi quando descobri esse especial, agora em 2017, que resolvi me agarrar de vez a esse grande, que vez ou outra me prende a alguma história mirabolante. Já estava lendo "A vida como ela é", volume I, mas uma amiga me enviou - sem saber dessa ligação atual com Nelson Rodrigues - o livro "O casamento", o qual ela já havia terminado de ler e estava me emprestando. O livro viajou de Fortaleza a João Pessoa, mas terminei mais rápido que o percurso que ele deve ter enfrentado.

"O casamento" é uma bela viagem a uma festa que você não foi convidado, mas está a espreita, observando tudo de longe. Fico fascinada com essa capacidade inata de Nelson Rodrigues de transformar um dia, em um livro. Sem spoiler, a história se passa na véspera do casamento de Glorinha e Teófilo. E todo o livro acontece em 24h. Nelson consegue falar sobre a vida, sem imitá-la, sem entregá-la à monotonia ou clichês. 

Sempre me chamou muita atenção a recorrência de casos de traição, morte e vingança nos contos de Nelson Rodrigues. Em "A vida como ela é" as histórias estão recheadas de adultérios. Quando comecei "O casamento" tive a impressão de encontrar muitas diferenças. Uma crônica expandida sempre dá margem para muitas mudanças durante o seu enredo. Não posso dizer que o livro é mais do mesmo, porque Nelson sempre surpreende, nunca decepciona. Mas existe nele a marca da sua escrita: o toque de realidade em uma ficção mascarada pelas mentiras e intempéries da vida. 

"O casamento" nos deixa extasiado, vidrado, prontos para acompanhar um desfecho massacrante em uma festa matrimonial bem marcada e prestes a acontecer. Começá-lo nos dá uma boa vontade de terminá-lo, pois a impressão que fica é que, quando paramos a leitura, paramos também o dia. E retornamos, logo depois, de onde estávamos, como se do lado de cá da realidade as horas também não passassem. Essas extravagâncias de Nelson é que me fazem vidrar nas folhas do livro. Recheado de paixões, desarranjos e desencontros, "O casamento" não fica para trás das crônicas humanas e agoniadas de "A vida como ela é".

Quando encerrei o último capítulo, a única frase que ainda vinha a minha mente era: a vida é Nelson. Isso tudo tem a ver com pertencimento. Com sentir-se parte e carne durante a leitura. Com transportar-se para a história, imaginar cenas e cotidianos que não são os nossos e se envolver em tragicomédias até certo ponto inacreditáveis. A vida é Nelson.

Dani Fechine

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